Discussões nas redes
sociais, piadas preconceituosas, brigas entre manifestantes e até relações
rompidas por questões políticas. O cenário dos últimos tempos tem mostrado quão
intolerante é grande parte dos brasileiros quando o assunto é a opinião alheia.
Na competição entre o certo e o errado, todos perdem, pois, o progresso só
surge a partir da colaboração de todos.
Muito além de
chegar à solução da maior crise política desde a redemocratização do Brasil, é
preciso prestar atenção às mensagens que os adultos têm passado às crianças.
“Não é se adaptar ao que os outros querem, mas sim ter a capacidade
de compreender, lidar com avaliações diferentes e conviver com estas
opiniões divergentes de modo respeitoso”, explica Marco Gregori, criador
da Rede VIAe, método educacional que estimula competências e habilidades
como empreendedorismo, tecnologia, colaboracionismo e a tolerância.
O que é tolerar?
É preciso ter
em mente o real significado de tolerância. Ao contrário do que algumas pessoas
pensam, tolerar não é um ato de generosidade, de dar espaço para o outro ou de
se privar para que o próximo tenha sua chance. “É apenas o reconhecimento
necessário de que no espaço público o direito de ocupação é de todos. Portanto,
para estar com os outros é preciso enfrentar a condição de perder um pouco do
seu”, afirma a psicanalista Ilana Katz. Em outras palavras: é aceitar o
convívio em conjunto.
Para as crianças
pequenas o conceito é algo complexo de se entender. Porém, elas assimilam
facilmente o que é aceitação e rejeição – neste caso, a intolerância será
percebida como rejeição. “As crianças (e muitos adultos) têm dificuldade em
lidar com esse sentimento de rejeição, e o associam à falta de afeto. Por isso,
é importante que os pais expliquem e exemplifiquem que a tolerância é baseada
na compreensão do outro, e que mesmo discordando de uma opinião, podemos (e
devemos) continuar a gostar da pessoa”, explica a psicóloga Rita Calegari.
Desde sempre
Não é preciso
esperar que momentos críticos apareçam para ensinar os pequenos a praticarem a
tolerância com o próximo. Deve fazer parte da educação a conscientização de que
se conviver em harmonia com pessoas de opiniões e características diferentes é
algo normal.
Gregori
ressalta que nenhuma criança nasce intolerante, mas pode acabar se tornando
devido à convivência. Por isso, quanto antes ela for exposta a algumas
habilidades, como empatia, colaboração e raciocínio crítico, melhor.
Você como exemplo
Pai, mãe, avôs,
tios, professores e os demais adultos que fazem parte do dia a dia da criança
são uma grande referência a elas. Assim, o primeiro passo para trabalhar o
respeito alheio é ser o exemplo. “A experiência da tolerância é o exercício da
cidadania que apresentamos a nossos filhos muito mais por transmissão do que
por ensinamento”, destaca Ilana.
Segundo Rita, a
tolerância deve ser uma competência dos pais que se passa aos filhos por meios
das atitudes e discursos, porém, evitando os conceitos formais e investindo em
exemplos práticos. “Logicamente que todos nós temos fragilidades, alguns
preconceitos ou posturas mais radicais quanto a certos temas. Mas ser
consciente deles já é um começo”, esclarece a profissional. Mesmo os pais
separados, é essencial que eles cheguem a um acordo entre temas principais.
O ambiente ao redor
Ainda que a mãe
e o pai se empenhem em dar o exemplo, o ambiente em que se vive não pode ser
controlado totalmente, e outros adultos e crianças podem influenciar os
pequenos. Caberá aos pais conversarem com as pessoas que mais convivem com os
filhos e explicar seu ponto de vista sobre determinado assunto – que nem sempre
são os mesmos valores da família em que esse adulto cresceu. “Pedir que maneirem
na frente dos pequenos pode ser mais fácil de conseguir aderência, porque mudar
o jeito de ser requer muita boa vontade do adulto”, afirma Rita.
Se ocorrer
alguma situação considerada intolerante pelos pais, uma opção é conversar com a
criança e buscar explicar sua posição: “você ouviu o que o titio falou? O que
você acha sobre isso? Eu penso diferente...”.
Fato é que se
deve evitar brigar ou excluir do convívio da criança as pessoas com opiniões
diferentes, já que eles próprios poderão ser percebidos como intolerantes pelos
filhos. “É absolutamente necessário que possamos ajudar os filhos a sustentarem
alguma curiosidade pelo outro, pelo que lhe é diferente. É preciso que
ensinemos a criança a fazer perguntas sobre o que não sabe, e não a eliminar o
que desconhece e lhe é diferente”, complementa Ilana.
O papel da escola
Fazer amizades
é uma verdadeira prática de tolerância. E isso as crianças precisam encarar
logo nos primeiros dias na escola. Por isso, os educadores têm um papel
fundamental no processo de conscientização. “O que faz a criança sofrer é a
consequência da intolerância, que é a rejeição. Ser rejeitado pelos amiguinhos
da escola é uma das experiências mais duras de se superar na infância”, destaca
Rita.
Por isso, na
hora de escolher a escola da criança, procure saber como a instituição aborda
as habilidades de convívio, se há alguma metodologia e como ela é colocada em
prática. “A escola e o professor também transmite sua posição a partir do modo
que lidam com concordâncias, discordâncias e de como administram a diversidade
no espaço comum. Como a escola lida com a diversidade? Como propõe sua relação
com a cidade? Quais espaços os temas de direitos humanos têm na grade
curricular? Essas são algumas perguntas que podem ajudar”, aponta Ilana.
Rita destaca
que no caso de haver atitudes intolerantes por parte dos alunos, a escola deve
estar preparada para lidar com a situação de forma inclusiva: chamando pais e
crianças para o entendimento dos motivos da intolerância e agir junto para
revertê-la em sentimentos positivos. “Pais e mestres não podem, jamais, se
isentar de suas responsabilidades diante de um assunto como esse”, afirma.
Colocando em prática
Marco Gregori,
da Rede VIAe, destaca algumas ações que ajudam as crianças a lidar com o
diferente.
1 - Dê o exemplo. Mostre
que você (mãe, pai, avó, avô, tio, tia, padrinho, madrinha) sabe lidar com
opiniões distintas da sua, com maturidade e respeito.
2 - Ensine empatia.
É fundamental ajudar as crianças a se colocarem no lugar do outro e a
entenderem que há lógicas distintas.
3 – Lembre-se de
situações positivas de tolerância. Traga à memória dos pequenos
casos em que eles lidaram com o diferente de forma tranquila, como o amiguinho
de outro time e o primo de outra religião.
4 – Ajude a refletir.
Questione as crianças se faz sentido que elas maltratem outras crianças só
porque elas pensam diferente. Ao pensar racionalmente, a resposta fica óbvia.
Nossas fontes
Ilana
Katz, psicanalista especialista em psicologia e educação
Marco
Gregori, criador da Rede VIAe
Rita
Calegari, psicóloga da Rede de Hospitais São Camilo de São Paulo
FONTE:
Artigo
desenvolvido pelo projeto Na Mochila, que em parceria com as escolas oferece
uma revista por bimestre aos pais de alunos do ensino Infantil e Fundamental I.